terça-feira, 5 de agosto de 2008

O jardim de Anette - por Malina



"Quem te falou sobre causa e efeito?
Quem te falou sobre um coração que não esquece?
Quem te falou sobre fama e fortuna?
Quem te falou que o demonio não tem nome?"
(The 69 eyes)

Anton acabara de acordar e mal podia ver o que estava ao seu redor. Sua visão estava turva e sua cabeça doía intensamente.
Tentou se levantar até que notou que estava amarrado. Os braços esticados em direção ao seu corpo, estavam presos á duas cordas grossas.

Anton levantou a cabeça lentamente e tentou olhar ao seu redor mas o lugar era escuro e apenas a luz da rua iluminava o local aonde estava. Mesmo com a visão debilitada ele pôde perceber que o chão era de uma terra escura, logo no final do cômodo pôde ver também algo que se assemelhava a um tronco de árvore.

- Puta merda! O que fui fazer! - Exclamou para si mesmo num momento de raiva, mas logo se arrependeu por ter falado alto.

Ele não sabia aonde estava e nem como tinha chegado ali, mas sabia que algo estava errado e que precisava se soltar das cordas que o prendiam.

Anton era um homem de trinta e sete anos, casado e bem-sucedido em sua vida profissional. Era alto e sempre zelava pela saúde do seu corpo, chegava a ser um tanto vaidoso. Embora fosse casado, tinha alguns relacionamentos fora do casamento e fazia questão que sua esposa fosse totalmente poupada de seus deslizes. Justificava para si mesmo que tais relacionamentos eram somente uma forma natural de obter prazeres carnais sem expor sua esposa.
De qualquer forma ele estava preocupado agora, suas fantasias nunca tinham atingido um nível desses e ele tampouco gostava de ser dominado.

Seu suor escorria em sua testa formando uma pequena poça ao lado de sua cabeça, seus punhos ardiam e ele já estava se sentindo nauseado por causa da situação. Não importava o esforço que fizesse, ele nunca conseguiria se soltar.
Já tinha imaginado trezentas formas de se livrar dali, quem quer que fosse, iria voltar e ele estava pensando em como agir. Não sabia se ficava acordado e gritava ou se fingia de desmaiado e estudaria um modo de se soltar.

Anton estava completamente mergulhado em suas hipóteses quando a luz acendeu o forçando a optar pela segunda opção. Ele ficaria imóvel esperando uma oportunidade de se salvar. Fechou os olhos e sentiu que alguém se aproximava.

- Olá Anton. - Disse uma voz feminina que ele tentou reconhecer de imediato, mas não obteve sucesso. - Não adianta fingir que está dormindo querido, o efeito da anestesia acabou há dez minutos.

Anton abriu os olhos e o fracasso estava estampado em seu olhar. Virou a cabeça em direção da desconhecida e viu que se tratava de uma linda mulher.

- Ah! Assim está melhor. Não banque o espertinho comigo, tudo bem? - Disse Anette, uma mulher extremamente atraente. Morena com os cabelos cacheados até no meio das costas, olhos verdes e belíssimas pernas. Anette vestia um vestido preto de decote ousado e bordado com pequenas pedras brancas.

Ela se aproximou com um sorriso sarcástico e passou a mão nos cabelos de Anton, como um simples gesto de carinho. Anton desviou seu olhar, virando a cabeça para o outro lado quando viu que estava em um jardim. Um suspiro de desespero ameaçou sair de sua boca, mas Anette a tampou, virando novamente seus rosto em sua direção. Anette inclinou-se em direção á ele e olhando dentro de seus olhos continuou:

- Gostou do meu jardim, querido?

- O que você quer? - Disse Anton com a voz trêmula. - Eu tenho dinheiro, faço o que quiser, apenas me deixe ir.

- Ora amor, não seja covarde. Você não faz o estilo. - Anette falou e se distanciou dele, caminhando até o outro canto do jardim.

Anton se esforçava para identificá-la, mas não fazia idéia da onde a tinha conhecido. Ela ainda estava de costas para ele enquanto ele se ocupava em olhar as amarras dos seus braços, Anette notando sua inquietação, voltou-se vagarosamente e mostrou a ele uma faca enorme.

- Isso resolveria seu problema? - Perguntou com sua voz angelical.

- Sim querida, essas amarras estão me machucando. Tire-as para mim? - Ele disse com a esperança de poder enganá-la.

- Anton, você está sendo tão previsível. Sempre vi isso em filmes, mas não achei que acontecesse realmente. Primeiro, você tenta fingir de morto, depois, tenta me comprar com seu dinheiro sujo e agora tenta se fazer de amigo? O que mais você vai tentar? Gritar? - Ela concluiu com uma gargalhada diabólica que o fez tremer.

E foi exatamente o que ele fez. Gritou por socorro á plenos pulmões até que ela tampasse sua boca.

- Shhhhhhh, quietinho amor. - Ela ainda gargalhava. - Você vai precisar da sua voz quando eu começar, poupe-a.

Anton a encarou com pavor.

- O que você quer? Me matar?

- Sim. - Ela falou enquanto olhava a lâmina reluzente da faca em sua mão. - E sabe o que pode lhe livrar disso?

- O que? Diga-me, farei o que mandar! - Anton estava desesperado.

- Nada. - Ela sorriu novamente.

Anette virou-se para ele e ainda olhando a faca, passou-a em toda a extensão do braço de Anton o fazendo gemer de dor. Quando chegou próxima ao punho, fitou o corte enorme que se abria aos poucos e que começava a sangrar.

- Grite querido, o gato comeu sua língua? - Ela perguntou se inclinando em sua direção e tocando sua boca com a ponta dos dedos.

- Sua vagabunda!

- Do inferno. - Anette completou logo ferindo lentamente a perna de Anton, dessa vez com mais força. Anton quase desmaiou quando teve a sensação de que a ponta da faca arranhava seu fêmur. Ele ficou pálido e sua respiração ofegou, estava quase perdendo os sentindos quando ouviu a voz de Anette.

- Se desmaiar, eu paro e o espero acordar. Então? Vamos ou não prolongar nossa festinha?

Nesse momento Anton pareceu ter finalmente percebido que aquela seria a noite em que morreria.

- Acabe logo com isso. - Ele ordenou com a última dose de coragem que restava em seu corpo.

Anette soltou uma gargalhada e subiu em cima dele, apertando a faca em seu peito e descendo até o umbigo. Anton não gritou, a dor não permitiu. Ele apenas fechou os olhos, o grito foi interno. Ele trincava os dentes enquanto Anette passava a mão em seu peito ensanguentado e abria ainda mais o corte feito.

Ele tentou encará-la, mas era demais para ele. Ela aos poucos deitou, e aproximou a cabeça da ferida, quando levantou, seu rosto estava coberto de sangue.

- Como você é doce por dentro! - Exclamou em delírio, mas logo se levantou e retornou á sua posição inicial, ao lado de Anton.

Aos poucos foi cortando levemente o corpo de Anton, voltou aos braços, desceu pelo peito e finalmente chegou ás pernas. Ele já estava enfraquecido e o pavor já não o dominava, quando ela começou a cantalorar um música de ninar.

- Anton! - O fez acordar do seu semi-desmaio. - Sabe quantos já estiveram no seu lugar? Sabe quantos homens já deitaram nessa maca? Muitos, meu bem, muitos. Está vendo esse jardim? É ali atrás aonde você vai ficar, já preparei tudo enquanto você dormia. É aqui, nessa terra escura, que você vai descançar e me fazer companhia nas minhas tardes chuvosas. Sabe, eu adoro ler aqui, ainda vou lhe contar mil histórias, vamos ficar juntos para sempre, eu, você e meus outros companheiros.

Anton ficou com medo de levantar a cabeça e ver o seu estado, apenas olhou para a luz e disse:

- Você é doente.

- Não, não sou. - Ela retucou. - Você é doente, ou seria inocente? Seguro demais para poder se aproximar de mim? Não sei. Só sei que você não deveria ter me olhado daquele jeito mal-educado naquele bar, você quase me comeu com os olhos querido! E veja agora aonde está! No meu jardim. - Fez uma pausa, sussurrando em seguida - no meu jardim secreto.- Sorriu.

Anton não resistiu mais por muito tempo, seu corpo doía indescritívelmente e ele começou a desfalecer. Sentiu como se tivesse um caminhão em cima dele e em poucos minutos sentiu um frio terrível.
Anette soltou as cordas que o amarravam mas era tarde demais, ele não conseguia nem abrir os olhos. Ela o jogou na terra e com certa dificuldade o arrastou até o outro canto do jardim, o jogando em sua cova rasa. Começou a jogar a terra em cima dele, ele ainda respirava.

Anette sorria enquanto cantarolava baixinho:

"Jardim escondido,
Não ultrapasses o caminho permitido,
Onde a noite jaz,
Se se aproximares muito,
Não saíras jamais!"

Um comentário:

Camila Bernardini disse...

Nossa! sso serve para aprnder que por trás de uma grande beleza pode ter um ser demoníaco...adorei linda!